O líquen plano da mucosa oral (LPO) trata-se de uma afecção que pode aparecer isolada
ou associada ao líquen plano cutâneo, havendo contudo diferenças significativas
clinico-evolutivas, como seja o LPO tende a ser crónico, recidivante e de difícil
tratamento (Nico, et al., 2011).
Sendo que o diagnóstico, segundo Ingle (2002) é o procedimento em que ao aceitar um
paciente, reconhece que este tem um problema e determina a causa do mesmo,
desenvolvendo um plano de tratamento que resolva e/ou alivie o problema. Torna-se
pertinente determinar se o diagnóstico de LPO, pode afectar o plano de tratamento,
prognóstico e a necessidade de terapia de apoio para complementar o tratamento
propriamente dito (Gutmann, 2009).
Como doença mucocutânea inflamatória crónica, mediada por células T, de causa
desconhecida. Caracteriza-se, na pele, por erupção papulosa, que ocorre na maioria dos
casos entre os 30 e 60 anos de idade, todavia já existem relatos em crianças (Nico, et al.,
2011). Torna-se assim necessária a correta avaliação do Médico Dentista (MD), que
antes de iniciar qualquer tratamento primeiro necessita reunir todas as informações
disponíveis sobre os sinais e sintomas, bem como o resultado dos testes de diagnóstico
(Jafarzadeh & Abbott, 2010a). Devido à sua relativa frequência, cronicidade, remissão
espontânea rara, com potencial maligno e frequentemente fonte de morbilidade (Regezi
& Sciubba, 2000).
II - LÍQUEN PLANO ORAL - LESÃO PRÉ-MALIGNA
1– Lesão pré-maligna da cavidade oral
Desde 1978 a Organização Mundial de Saúde (OMS) classifica o líquen plano como
sendo uma condição cancerígena pré - maligna, existindo controvérsias entre diversos
autores. Cerca de 2 a 3% das lesões tornam-se malignas. Porém menos que 0,5% dos
líquenes plano em não fumadores desenvolvem carcinogenese. É mais comum a
transformação maligna em líquenes erosivos ou atróficos (Santos & Teixeira, 2011). O
risco de transformação aumenta quando o portador de líquen é exposto a factores
mutagénicos, (pois este torna-se mais sensível), eles são o tabaco, tabaco de mascar,
álcool, e a candidíase (Ismail, et al., 2007).
1.1. Definição e conceito de líquen plano oral
O Líquen Plano é uma desordem relativamente comum, crónica, inflamatória que afecta
a mucosa oral e tecidos subjacentes. O líquen plano oral ocorre mais frequentemente na
sua forma cutânea e tende a ser mais persistente e mais resistente ao tratamento
(Edwards & Kelsch, 2002) e (Bermejo-Fenoll et al., 2010).
Por ser uma doença crónica auto-imune mediada por linfócitos T que afecta o epitélio
escamoso estratificado (Roopashree, et al., 2010), é considerada uma das doenças
dermatológicas mais comuns que acometem a cavidade oral, com prevalência de 1% a
2% na população geral (Sousa & Rosa, 2008). Contudo, pode apresentar-se na pele,
anexos da pele, cavidade oral e mucosa extra-oral como vulva e vagina (Scully &
Carrozzo, 2008). Na mucosa oral encontra-se mais frequentemente a nível da mucosa
jugal, gengiva e bordos laterais da língua (Regezi & Jordan, 2008).
Pode manifestar-se, como se verá mais aprofundadamente num dos sub-capítulos
seguintes, de diversas formas clinicas como atrófico, bolhoso, erosivo, em placa,
papular e reticular (Canto, et al., 2010).
Por ser uma doença com poucos pontos de concordância, e uma vez que quase todos os
aspectos relacionados com o LPO são alvo de muita controvérsia, especialmente em relação ao seu potencial de transformação maligna (Sousa & Rosa, 2008). Torna-se
pertinente compreender a origem da doença, sendo necessário levar em consideração
diversas características ligadas à pessoa, espaço físico e temporal, para poder determinar
as medidas de prevenção e controlo mais indicadas para resolver a doença. Desta forma,
em seguida abordar-se-á a epidemiologia desta patologia.
1.2. Epidemiologia do líquen plano oral
Actualmente compreende-se como epidemiologia a ciência que estuda o comportamento
das doenças numa determinada comunidade, de forma a avaliar quais serão as
estratégias a serem adoptadas e se as mesmas causaram impactos, diminuindo e
controlando a ocorrência da doença em análise.
Estima-se que a prevalência do LPO varie entre 1% a 2%, na população em geral
(Gorsky, et al., 2004), (Sousa & Rosa, 2008) e (Vélez, 2013). Já Nico et al. (2011)
apresentam valores compreendidos entre 0,5% a 4% da população em geral, havendo 1
forte predilecção no sexo feminino. A idade de ocorrência na maioria dos casos fica
compreendida entre os 30 e 70 anos de idade, especialmente na 5ª e 6ª década de vida
(Farhi & Dupin, 2010) (Lodi, et al., 2012). Já Eisen (2002), Edwards & Kelsch (2002),
Laeijendecker et al. (2005), Sousa & Rosa (2005, 2008), referem que esta doença, afecta
mais nestas décadas, mas no sexo feminino, mas Bombeccari, et al. (2011), considera
que o LPO afecta mais as mulheres acima dos 40 anos, não descartando que esta doença
também pode afectar indivíduos menores de 18 anos, preservando as mesmas
características clinicas com as quais se manifesta nos adultos, mas com prognóstico
mais favorável.
Bascones-Ilundain, et al. (2006), Ismail, et al. (2007) e Carrozzo & Thorpe (2009),
relativamente a prevalência das estimativas entre diferentes populações, aludem que
parece exibir uma predilecção racial, sendo que na população espanhola é de 0,2 a 2%,
0,5% na população japonesa, 1,9% na população sueca, 2,6% na população indiana,
0,38% na Malásia. Sousa & Rosa (2008) observaram que, as mulheres são quatro vezes
mais acometidas do que os homens e que indivíduos da raça branca possuem um risco
cinco vezes e meia maior de desenvolver a doença, comparada com as demais raças. No estudo de Sugerman & Porter (2010), existe referência que nos EUA a prevalência é
desconhecida.
Numa perspectiva histórica, pode-se constatar que os estudos que existem referem que
Regezi e Sciubba (2000), considera que a doença reporta-se entre homens e mulheres
aproximadamente em números iguais, Azul & Trancoso (2006), Grossmann, et al.
(2006) e Ismail, et al. (2007), consideram que a doença reporta-se numa relação de 2:1
entre mulheres e homens, Grando, et al. (2012), referem que, é comum em mulheres de
meia-idade na proporção de 3:2 em relação aos homens.
A nível de localização na região intra-oral, o estudo de Mignogna et al. (2005), avaliou
700 pacientes com LPO, e relata que 48% dos mesmos tinham comprometimento
gengival e que em 7,4% dos pacientes pesquisados, as lesões limitavam-se somente à
mucosa gengival. Além disso, observaram ainda que 20% dos casos de transformação
maligna envolviam a mucosa gengival reforçando ainda mais a importância do exame
histopatológico no diagnóstico final da doença.
É de reforçar que as lesões da mucosa oral ocorrem em 50 a 70% dos doentes com
líquen plano oral e podem ser exclusivas em 20 a 30% dos doentes. Esta não é uma
doença que afecta apenas a mucosa oral e genital, muito raramente também atinge a
mucosa anal, do nariz, laringe, conjuntiva e uretra (Nico et al., 2011).
1.3. Características clínicas do Líquen Plano Oral
Clinicamente o LPO possui características distintas e fáceis de serem identificadas
apresentando-se sob duas formas principais: reticular e erosiva, embora existam outras
formas mais raras de apresentação (Edwards & Kelsch, 2002) (Eisen, et al., 2005).De
facto, segundo Sousa & Rosa (2008), Canto et al. (2010) e Vélez (2013), existem outras
quatro formas descritas: papular, “em placa”, bolhosa e atrófica.
1.3.1. Forma reticular
Será a forma que ocorre com maior frequência caracterizando-se por linhas brancas
entrelaçadas, conhecidas como estrias de Wickham, e em geral, encontram-se cercadas por uma discreta borda eritematosa. Podem não ser evidentes em alguns locais, como o
dorso da língua, onde as lesões se apresentam como placas queratóticas. Não causa
sintomas e envolve a mucosa jugal posterior bilateralmente. Existe ainda registos, em
que podem estar envolvidos ao mesmo tempo, o dorso e a parte lateral da língua, as
gengivas e o palato (Mollaoglu, 2000), (Edwards & Kelsch, 2002), (Neville, et al.,
2004), (Ingafou, et al., 2006), (Regezi & Jordan, 2008) (Scully & Carrozzo, 2008),
(Sousa & Rosa, 2008), (Carrozo & Thorpe, 2009), (Canto, et al., 2010), (Castillo &
Peña, 2012).
1.3.2. Forma erosiva
A par da forma reticular, existe a forma erosiva, ou seja, embora não seja tão comum é a
mais significativa para o paciente porque as lesões são sintomáticas, variando desde o
simples desconforto até episódios de dor intensa capaz de interferir com a função
mastigatória, principalmente com alimentos quentes, picantes ou ácidas. Manifesta-se
clinicamente por áreas atróficas e eritematosas frequentemente cercadas por finas estrias
radiantes, ou por uma ulceração coberta por uma placa fibrinosa ou pseudomembranosa.
(Ismail,et al., 2007), (Sousa & Rosa, 2008), (Canto, et al., 2010), (Castillo & Peña,
2012).
1.3.3. Forma bolhosa
Se o componente erosivo for muito grave, poderá ocorrer separação do epitélio,
resultando nesta forma de líquen plano bolhoso. O diâmetro das bolhas varia desde
pequenos milímetros a centímetros e tendem a romper tornando-as dolorosas. A
periferia da lesão encontra-se normalmente rodeada por estrias queratinócitas finamente
irradiadas ou reticulares. Encontram-se geralmente na mucosa jugal em especial nas
regiões posteriores e inferiores adjacentes aos 2º e 3º molares. (Edwards & Kelsch,
2002) (Neville, et al., 2004) (Regezi & Jordan, 2008) (Sousa & Rosa, 2008), (Canto, et
al., 2010).
1.3.4. Tipo “em placa”
Este tipo apresenta irregularidades esbranquiçadas e homogéneas que se assemelham a
leucoplasia, ocorrendo, principalmente no dorso da língua e na mucosa jugal. Estas
lesões podem ser multifocais, mudando o aspeto, tornando-se elevadas e/ou rugosas.
(Canto, et al., 2010)
1.3.5. Forma papular
Sendo uma forma raramente observada, é normalmente acompanhada por outro tipo de
variante descrita. Caracteriza-se por pequenas pápulas brancas, com diâmetro a oscilar
entre 0,5mm e 1,0mm, com estriações finas na sua periferia (Ismail, et al., 2007),
(Canto, et al., 2010).
1.3.6. Forma atrófica ou eritematosa
Apresenta-se com lesões avermelhadas difusas, podendo aparentar ser uma mistura de
duas formas clinicas, como a presença de estrias brancas características do tipo reticular
circundada por uma área eritematosa. É sintomática, uma vez que produz uma sensação
de queimadura, hiperestesia, dor e mal-estar generalizado. Em cerca de 10% dos
pacientes, as lesões confinam-se à gengiva, caracterizando-se por uma área eritematosa
ou ulcerada localizada na gengiva e associada a pequenas áreas esbranquiçadas
denominada: gengivite descamativa (Ismail, et al., 2007) (Canto, et al., 2010), (Castillo
& Peña, 2012).
1.3.7. Lesões extraorais
As lesões extraorais cutâneas, ocorrem em indivíduos entre os 25-60 anos, e não
apresentam uma predilecção racial nem sexual. Acometem entre 2% a 3% dos pacientes
com LPO e são divididas em lesões cutâneas, genitais, ungueais, actínicas, hipertróficas,
vesículo-bolhosas e mistas (Canto, et al., 2010). Já Sousa & Rosa (2008), completa
dizendo que outros locais de envolvimento extra-oral incluem para além dos citados a
mucosa esofágica. Carrozzo (2008), já reporta a mucosa urinária, nasal, laringeal, óptica
e anal apesar de raramente envolvidas.
Aproximadamente 20% a 25% das mulheres com LPO apresentam também
envolvimento concomitante das mucosas vulvar e vaginal, comparativamente com 2% a
4% dos homens na glande peniana. Nas mulheres, as lesões por LP também são
cocumitaneamente designadas por síndrome vulvo-vaginal-gengival e nos homens de
síndrome pêro-gengival e são sintomáticas, podendo apresentar ardor, descarga vaginal, dispareunia e dor. Estas lesões senão forem atempadamente tratadas podem tornar-se
malignas (Ismail, et al., 2007), (Scully & Carrozzo, 2008).
Cerca de 15% de todos os pacientes com a doença exibem lesões cutâneas. Estas lesões
cutâneas têm sido classificadas como pápulas poligonais pruríticas purpúreas que
afectam normalmente as superfícies do flexor das extremidades. Podem ainda
apresentar sensação de irritação cutânea, que doem quando o paciente coça (Eisen,
2002), (Neville,et al., 2004), (Sousa & Rosa, 2008).
Regezi & Jordan (2008) referem que normalmente estas lesões desenvolvem-se poucos
meses depois do LPO e, embora as alterações orais sejam mais constantes observa-se
que as lesões cutâneas correspondentes avançam e retrocedem e possuem curso clinico
de aproximadamente 1 a 2 anos.
Fonte: CEITA , Jackson . Líquen Plano Oral – Lesão Pré-Maligna?. 2014. 1-51 p. Dissertação (Mestrado)- Universidade Fernando Pessoa , Porto,2014. Disponível em: . Acesso em: 11 mar. 2017.
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